terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Cansaço!

O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço...
Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Se sou só isto não quero ser mais nada

Se sou só isto não quero ser mais nada

Depois do que vejo a cada dia que passa, espalhado pelos quatro cantos do meu pequeno mundo e que me deixa muita vez atrozmente parado a observar, tal qual pássaro no alto da chaminé. Atrevo-me a dizer que se sou só isto, não quero ser mais nada.
SE para ser mais, tenho de ser arrogante, se para ser maior tiver de espezinhar quem me rodeia, se para ser maior tiver de fazer dos outros pequenos, Se para ser mais rápido tenho de fazer os outros tropeçar, então prefiro não ser!
Não quero ser mais nada.
Não quero ser mais nada do que aquilo que sou!
Não preciso das aparências, não quero o acessório.
Sou o que sou e não que pareço.
Posso não saber sempre aquilo que quero, mas tenho toda a certeza daquilo que não quero.
As minhas vitórias são tudo aquilo que conquistei, e até mesmo aquilo que perdi, um dia eu conquistei, aquilo que nunca conquistei, nunca foi meu, nunca ganhei!

Por isso e por muito mais, por tudo aquilo que me faz levantar de manhã e olhar no espelho e sorrir, se sou só isto, não quero ser mais nada!